Introdução: Este relato provém de uma experiência de estágio obrigatório específico em Promoção e Prevenção em Saúde, do curso de graduação em Psicologia, realizado em um hospital escola do sul do país. Ao atuar no setor da pediatria, tive meu primeiro contato com a intersexualidade, e este sem dúvida foi um momento de estranhamentos. Este relato tem como foco a experiência em si, com todas as mobilizações e questionamentos que dela emergiram. O objetivo foi apresentar minhas inquietudes frente a este tema, refletindo minhas posições, que foram sendo modificadas e repensadas ao longo do período de estágio. Essas inquietações mobilizaram minha pesquisa de trabalho de conclusão de curso, que ainda se encontra em processo de construção. Relato da Experiência: Os estranhamentos: um bebê com nome masculino, mas que nasceu com características físicas de ambas as genitálias; uma equipe em alvoroço, que fazia o possível para lidar com a situação sem deixar que o sentimento de estranheza fosse tão evidente; um casal de classe social baixa, jovens, confusos e cansados, mas demonstrando-se tranquilos e fortes frente à situação. Antes de chegar ao leito onde estava o bebê intersex, a equipe me informou que a criança tinha genitália ambígua e fui aconselhada a não chamá-la pelo nome. Não sabia exatamente do que se tratava, fiz apenas a triagem e retornei ao setor de psicologia para saber mais informações. A partir deste momento, e em todos os diálogos que passei a ter com outros profissionais da saúde, novas questões foram formuladas, ressignificando, aos poucos, minha visão acerca da intersexualidade. Reflexões e Considerações Finais: Diversos questionamentos emergiram desta experiência e tantos outros continuam sendo levantados durante a escrita do meu trabalho de conclusão de curso. Questões acerca de temas como sexo, gênero, registro de nascimento, o papel da psicologia no âmbito dessas problematizações e dentro de um hospital geral, entre outros. Em um primeiro momento, meu olhar ainda era de senso comum, eu não via possibilidades neste corpo e meu discurso refletia um pensamento e uma cultura heteronormativos. Ao buscar conhecer mais, me questionar e perguntar a outros, fossem da psicologia ou não, meus conceitos foram sendo modificados, minha maneira de olhar e pensar sobre foi tomando a minha própria forma. Então percebi o quanto o meio influência nossas reflexões sobre gênero e sexualidade. Na verdade, notei que os questionamentos nunca vão acabar e me sinto satisfeita com isto. Não existe mudança sem reflexões, sem questões, sem inquietações. Meu desejo de escrever sobre a intersexualidade é fazer com que estas problematizações não sejam só minhas, que as pessoas conheçam o corpo possível de um intersex e que aprendamos cada vez mais para sabermos lidar com nossas próprias questões e também com as de nossos pacientes.