Susan Sontag, em seu ensaio Doença como metáfora (1984), no qual procura analisar a doença como representação social, afirma que, na contemporaneidade, a loucura haveria tomado o papel da tuberculose como veículo “de nosso mito secular da autotranscendência“ (p.24.) É também como metáfora que a loucura surge no romance Jerusalém (2006), do escritor português Gonçalo M. Tavares. Entretanto, ao invés de ser tratada como a propiciadora de uma autotranscedência para aqueles que dela sofrem, a loucura aqui é muito mais uma forma de simbolizar a História como ruína. Nesse sentido, mais do que apenas uma metáfora, podemos dizer que a loucura na obra do romancista português se apresenta como alegoria, entendendo esta nos termos propostos pelo filósofo alemão Walter Benjamin (2004). Este trabalho intenta averiguar como a loucura se apresenta alegoricamente em Jerusalém. Se tal doença está intimamente relacionada com grande parte dos personagens do texto de Gonçalo M. Tavares, em dois deles sua presença parece ser mais representativa: o médico e pesquisador Theodor Busbeck e sua ex-esposa, a esquizofrênica e paciente de um sanatório Mylia. Nossa análise se deterá principalmente sobre esses dois personagens, o que nos permitirá trazer para a discussão questões a respeito desses dois papeis – médico e paciente – em relação com a doença.