, Milenabarrosmarquesdossantos et al.. . Anais CONADIS... Campina Grande: Realize Editora, 2018. Disponível em: <https://mail.editorarealize.com.br/artigo/visualizar/50503>. Acesso em: 24/11/2024 23:00
O conceito de Água Virtual, introduzido por John Anthony Allan no final dos anos 1990, consiste em compreender que o consumo de água por seres humanos não é limitado ao consumo direto, mas, ao comércio e consumo indireto da água embutida no processo de produção de diferentes produtos, especialmente das commodities agrícolas. Nesse sentido, o conceito relaciona-se diretamente com o de “pegada ecológica”. O Brasil está entre os países que mais exportam água virtual em produtos como carne e soja – o Nordeste Semiárido exporta mais do que importa. A proposta deste artigo é, de um lado, apresentar e discutir os resultados de uma revisão sistemática sobre o uso do conceito por pesquisadores brasileiros, particularmente os que atuam em instituições situadas em territórios do Semiárido nordestino, observando, dentre outras questões, o contexto dos usos, a natureza da produção, os enfoques, a compreensão implícita ou explicita de água, inferências sobre modelos de desenvolvimento e as evidências do tipo de apropriação (concordância, reforço, crítica etc); e, de outro, propor um debate sobre água virtual e desenvolvimento, dialogando, criticamente, com os achados. A pesquisa tem caráter exploratório e foi realizada em duas bases específicas de dados: o Portal de Periódicos da Capes e a Base Scielo Periódicos. Nas duas bases foram utilizados os mesmo descritores para a busca: água virtual e água virtual e sustentabilidade. Considerando que o conceito de água virtual aparece em texto datado de 1998, a pesquisa tomou como recorte, o período compreendido entre 1998 e 2018. Levou-se em consideração apenas os textos publicados, exclusivamente, no Brasil e em periódicos. Foram considerados, para análise, apenas os textos em que os descritores apareciam pelo menos no título, resumo ou palavras chaves. A análise dos achados foi feita à luz dos enfoques de CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade) e da abordagem da ecologia política. Em cerca de 70 textos, nas duas bases, foram observados que o conceito de água virtual apareceu mais em: estudos centrados na produção de commodities, gestão de recursos hídricos, agro e hidronegócio, importação e exportação, produção de alimentos e consumo de água. De maneira geral, o conceito aparece associado ao de pegada hídrica e sustentabilidade. A água, majoritariamente, é compreendida como recurso natural. Há mais aceitação do conceito que discussões que procurem ampliá-lo, reformulá-lo ou mesmo desconstruí-lo. Boa parte dos autores tem vínculos, ao menos declarado, com as Ciências Naturais. A transposição do São Francisco, o Vale do São Francisco e, sobretudo, a produção de fruticultura no Vale do São Francisco são temas em que o Nordeste e/ou Nordeste Semiárido aparecem nos textos. Há estudos com preocupações em políticas públicas de água, regulação, modelos alternativos de produção, reuso e atualização do conceito de gestão hídrica. Por diferentes caminhos e enfoques os estudos visitados apontam, não sem controvérsia, pelo menos cinco agendas: preocupação crítica com o excessivo uso de água pela agricultura, com questionamento sobre a quantidade de água empregada na produção e o significado dessa produção em termos nutricionais; comércio mundial de alimentos que representa uma gigantesca transferência de água entre países produtores e importadores, e o lugar do Brasil e, sobretudo, do Nordeste, nesse contexto; discussão que sinaliza para o enfrentamento epistemológico da relação água virtual e desenvolvimento e para o empoderamento político do conceito, pois nos estudos visitados a dimensão técnica se sobressai; apontamento de problemas em relação às políticas públicas e modelos de gestão hídrica em curso; e, indicação para que se olhe a questão da água virtual como evidência da racionalidade dominante, que considera a água como recurso que assegura a sustentabilidade de sua reprodução.