EM 1966, MICHEL FOUCAULT CUNHOU O CONCEITO DE HETEROTOPIA PARA ALUDIR AOS CONTRAESPAÇOS SOCIAIS. SÃO LUGARES ABSOLUTAMENTE OUTROS NOS QUAIS SE JUSTAPÕEM VÁRIAS FUNÇÕES QUE SÃO, OU DEVERIAM SER, INCOMPATÍVEIS. SÃO EXEMPLOS DE HETEROTOPIAS OS CONVENTOS, AS CASAS DE TOLERÂNCIA E OS INTERNATOS, MAS, IGUALMENTE, A CAMA DOS PAIS, O JARDIM DA CASA E AS VIAGENS DE NÚPCIAS – ESPAÇOS QUE SÃO UMA ESPÉCIE DE LUGAR ALGUM. NESTE ENSAIO, PROPOMOS UMA ANÁLISE DO FILME MYSTÈRE ALEXINA A PARTIR DAS HETEROTOPIAS. LANÇADO EM 1985 E DIRIGIDO POR RENÉ FÉRET, O FILME É INSPIRADO PELA AUTOBIOGRAFIA MINHAS MEMÓRIAS, ESCRITA POR HERCULINE BARBIN (1838-1868). HERCULINE FOI UMA PROFESSORA FRANCESA QUE, AOS 21 ANOS, TEVE SEU STATUS CIVIL RETIFICADO APÓS SER DIAGNOSTICADA COMO “HERMAFRODITA MASCULINO”. SUA AUTOBIOGRAFIA FOI PUBLICADA POR FOUCAULT NO LIVRO HERCULINE BARBIN DITE ALEXINA B. INSPIRADO POR ESSA VIDA SINGULAR, FÈRET CRIOU ALEXINA: UMA PROFESSORA RECÉM-CHEGADA AO INTERNADO FEMININO DE UMA PEQUENA CIDADE DO INTERIOR. RAPIDAMENTE, ELA SE APAIXONA POR SARA, A FILHA DA PROPRIETÁRIA, E ESSE AMOR É CORRESPONDIDO. NO DESENROLAR DO ROMANCE COM SARA, PERCEBEMOS QUE ALEXINA, ESSA JOVEM INTERSEXO, HABITA E INVENTA HETEROTOPIAS, PRODUZINDO CONTRAESPAÇOS POR MEIO DA AFIRMAÇÃO DA DIFERENÇA E DA PRODUÇÃO DE CONTRADISPOSITIVOS. DESDE DENTRO DO INTERNATO, ALEXINA E SARA FORJAM UMA HETEROTOPIA DO AMOR E DA DIFERENÇA, ABRINDO CONTRAESPAÇOS DE CONTESTAÇÃO E TRANSTORNANDO O ENTORNO. PRETENDEMOS, PORTANTO, REALÇAR ESSAS HETEROTOPIAS, PROVISÓRIAS E SUBVERSIVAS, SEGUINDO POR SUAS POTENCIALIDADES PARA DESARTICULAR AS NORMATIZAÇÕES SEXUAIS E PARA EVIDENCIAR AS DIVERSAS DISPUTAS SOBRE OS CORPOS SEXUADOS.