O escritor francês Charles Nodier, um dos escritores da conhecida “aurora romântica francesa”, é considerado o iniciador do conto fantástico no seu país. No entanto, essa constatação nos chegou apenas no século XX, quando essa vertente da literatura já se encontrava consolidada com inúmeras obras de escritores oriundos de diversos países. Na França, por exemplo, Nodier influenciou, diretamente, autores como Gérard de Nerval e Maupassant e é certo que sofreu influência de alemães como Hoffmann e Goethe. A produção nodieriana é marcada por diversos gêneros de escrita tanto no campo literário, quanto em outras áreas do conhecimento, como na biologia; reflexo disso se percebe, sobretudo, nos seus contos classificados por Castex (1947) como fantásticos. Assim, neste trabalho, pretendemos destacar essa característica em um desses contos e a nossa escolha é por aquele conto que foi considerado, pela crítica da época, como um texto incompreensível e sem nenhuma linearidade, sendo, portanto visto como o grande fracasso do seu escritor. Por essa razão, o nosso objetivo é a partir de uma leitura, destacar o quanto “Smarra ou les démons de la nuit” pode ser considerado uma obra literária vanguardista, pois apresenta ao leitor uma literatura que na primeira metade do século XIX ainda não tinha o prestígio que veio a ter anos depois. O referido conto é, segundo o próprio Nodier, um sonho; portanto, para que fosse compreendido precisaria ser lido como tal. De fato, essa narrativa apresenta uma “mise en abîme” de sonhos, retratando os labirintos oníricos que podem permear a mente adormecida do homem. O conto é, sem dúvida, um tratado sobre a força sobrenatural que habita no ser humano e que não pode ser controlada facilmente, pois o mundo onírico está além do real. Discussões sobre esse tema são feitas e embasadas no próprio Nodier que discute tal matéria que é tão estudada até os dias de hoje tanto pela literatura, quanto por outras áreas do conhecimento.