A troca de cartas entre Mário de Andrade e Luís da Câmara Cascudo, que vai de 14 de agosto de 1924 a 12 de junho de 1944, num total de 153 cartas, em 19 anos e dez meses de uma frutífera correspondência, é, segundo Jacques Le Goff (1994), um documento que deve ser visto como um monumento da história cultural potiguar e paulista. Interessa-nos, aqui, o fato de que as cartas de Luís da Câmara Cascudo enviadas a Mário de Andrade, assim como as cartas de Mário de Andrade enviadas ao escritor potiguar, contêm, com certeza, dados autobiográficos indispensáveis para uma melhor compreensão, não só do homem, do intelectual, mas sobretudo da obra, do próprio “corpus” bibliográfico cascudeano, sendo também mais um ângulo de visão do modernista e epistológrafo paulista. Além de iluminarem todo o contexto histórico, intelectual e cultural da época, estas cartas nos darão conta da repercussão do Modernismo no Rio Grande do Norte e das interferências desse movimento e de seu divulgador maior, Mário de Andrade, em nossos intelectuais e poetas. O discurso autobiográfico se apresentará como “conjunto de sintomas” desse movimento cultural e como campo de forças onde se debaterão as postulações modernistas para a cultura e a identidade brasileiras. A carta era o instrumento com que Cascudo abria caminhos fazendo amigos no Brasil e no exterior. Era a arma poderosa com a qual ele combatia, da província, a falta de informações, de novidades intelectuais e literárias que estavam acontecendo pelo Brasil e no exterior. Para Mário, era o meio de divulgar as ideias modernistas, de “atualizar” o Brasil e de “iniciar” os novos na literatura criando um estilo e uma língua brasileira também pela busca do folclore e do popular.