Este trabalho tem por objetivo analisar a poesia de Carmem Vasconcelos, inspirada no mito grego das Danaides, sob o olhar da crítica literária feminista. Conta a mitologia que as Danaides, as cinquenta filhas do rei Danao, foram prometidas aos cinquenta filhos de seu irmão, o rei Egito. Danao, que se opunha ao casamento, traçou um plano: presenteou todas as filhas com um punhal e ordenou que matassem seus maridos na noite de núpcias. Apenas uma, Hipernestra, não consumou o plano por ter se apaixonado pelo seu esposo, Linceu. Assim, as quarenta e nove moças mataram seus maridos e foram condenadas ao Tártaro, sua pena era encher com água um tonel cheio de furos por toda a eternidade. A poesia de Vasconcelos traz o mito para a atualidade apresentando uma distinta releitura que agrega questões relativas à sexualidade feminina e também aborda o delicado tema da clitorectomia, prática cultural que consiste na mutilação dos órgãos genitais femininos. Segundo Bonnici, a origem do ritual vem da estupefação dos homens diante do poder de fertilidade da mulher e da sua sexualidade. A prática é frequentemente associada à religião islâmica, mas estudos comprovam que essa questão é mais um problema de uma cultura sexista do que religiosa. A releitura do mito pela poetisa reforça a constatação de que ainda vivemos numa sociedade predominantemente patriarcal, em que a mulher continua a almejar a igualdade entre os gêneros. A literatura feminina vem dando sua contribuição denunciando várias formas de violência ainda sofridas por muitas mulheres.