Assumir a própria fala, como coloca Lélia Gonzalez, quando afirma que “o lixo vai falar, e numa boa” (1984), desvela o processo de silenciamento sofrido pelo sujeito negro ao longo da história. Para além do silêncio imposto, o negro é aquele que é falado pelo outro, que, historicamente, é retratado a partir do olhar do branco, do colonizador, dentro de uma lógica de dominação. Sendo assim, foram cristalizados estereótipos que associam a sua imagem à subalternidade, situando-o à margem. Nesse sentido, cabe a pergunta de Spivak, “pode o subalterno falar?” (1995), que problematiza o fato de mulheres não poderem falar e, quando falam, não terem quem as ouça. No caso da mulher negra, a pergunta se faz ainda mais relevante: pode a mulher negra falar? Sabemos que não. E não pode falar porque foi relegada ao silêncio, amordaçada, destituída de voz. Grada Kilomba (2019) reforça essa ideia ao relembrar a máscara do silêncio, instrumento de tortura usado por senhores brancos para impedir que os escravizados comessem do que colhiam e para impor o silêncio e o medo. Em seu livro Memórias da Plantação: episódios de racismo cotidiano, Kilomba traz a imagem da máscara de flandres para ilustrar os efeitos dessa técnica de tortura. Para a autora, a máscara simboliza uma estratégia colonial de dominação e de silenciamento dos chamados “Outros”. A partir disso, Kilomba elabora três perguntas que nortearão a discussão proposta: Quem pode falar? O que acontece quando falamos? Sobre o que podemos falar? Tais questionamentos têm como objetivo escancarar a estratégia colonial de dominação que perdura até os dias de hoje e tem suas ramificações na arte e na literatura. Partindo deles, conceitos importantes se intercruzam para explicar o lugar social ocupado pelo sujeito negro e, colocando-se como objetivo principal desta pesquisa, promover um deslocamento desse lugar.