O artesanato foi e ainda tem sido uma prática realizada majoritariamente por mulheres em muitos lugares, e isso atravessa diversas gerações. Será que foi esse vínculo com o feminino que fragilizou o artesanato frente ao processo de fabricação industrial? Qual a relação desses trabalhos/atividades com os espaços públicos e privados? E, mais ainda, qual a relação dessa discussão com o patriarcado e o processo de submissão das mulheres? Este ensaio - embora esteja longe de responder a todas essas perguntas - se propõe a se aproximar dessa discussão, problematizando a pauta feminista da dicotomia público-privado, a partir do viés do espaço doméstico. Para isso utiliza, como fio condutor, o trabalho artesanal, mais especificamente, o artesanato em crochê. Com esse intuito traz à tona memórias de Maria, que foi costureira e teve sua vida muito envolta pelo crochê. Para a construção do corpus do texto me reporto a arte de confeccionar guardanapos de crochê, enquanto técnica artesanal muito utilizada por diversas gerações de mulheres, em diálogo com o conceito de divisão sexual do trabalho, problematizando o trabalho feminino e o doméstico na sua intersecção com o artesanato. Assim, primeiramente apresento a importância teórico-metodológica do uso da memória no resgate das trajetórias de vida, defendendo seu uso nas pesquisas com mulheres. Na sequência trago um pouco da história do crochê, contextualizando o seu desenvolvimento ao longo do tempo e argumentando a importância dessa estratégia para pensar as trajetórias de vida das mulheres. E, para finalizar, apresento duas artistas contemporâneas, onde uma delas utiliza o artesanato em crochê em suas obras, provocando as mulheres, dessa forma, a se pensar e repensar suas trajetórias no mundo, entre os espaços público e privado.